Devido à proximidade do Exame Nacional do Ensino Médio
(ENEM), considerei a pertinência desta análise. A classe média brasileira, em
sua cegueira por cercear a imagem de Dilma Rousseff, assume gafes que não são aceitáveis
dentro de um contexto intelectual saudável. Lê-se que não proponho a
polarização política, mas uma análise linguística dos procedimentos empregados
nos discursos da Presidente do Brasil.
Antes de tudo, é preciso entender que os discursos são
textos e como tais apresentam natureza dialógica (BAKHTIN:1929). Em outras
palavras, há um emissor e um receptor. Dizendo assim parece óbvio, todavia,
conhecer esses dois sujeitos faz toda a diferença na seleção vocabular, na
estrutura dos períodos, nos atos de fala e figuras de linguem. Se o equilíbrio
entre emissor e receptor não for mantido, ruídos de linguagem bloquearão a
compreensão do texto.
O primeiro discurso a ser analisado é o de julho de 2015. A
frase viral "Não vamos colocar uma meta, vamos deixar a
meta aberta. Depois vamos dobrar a meta.” Mais do que não conseguir compreender é simplesmente não incutir o
mínimo esforço para a interpretação. Algumas intertextualidades, associadas ao
conhecimento de mundo fazem-se imprescindíveis. Primeiramente, o contexto
refere-se ao SEBRAE, um grupo de apoio às pequenas e médias empresas, que
curiosamente trabalha com metas para seus clientes. O trabalho com metas nas
empresas costumeiramente gera queda na qualidade do serviço. Algo semelhante
ocorreu com o surgimento das NEPs na Rússia, onde metas estabelecidas a cada 5
anos eram superadas e, como consequência, houve uma grande perda de capital
humano. Deixar algo aberto significa não estabelecer um limite para o
crescimento. Dobrar a meta “infinita” significa, então, sempre superar a si
próprio.
Outro discurso que chama atenção é o de junho
de 2015 com as frases “a mandioca é uma das maiores conquistas do Brasil” e “nos
tornamos homo sapiens ou mulheres sapiens”. A primeira é uma referência ao
marco histórico onde deixamos de ser nômades para sermos sedentários. Plantamos
nosso próprio alimento, que no caso do Brasil é a mandioca. O Brasil conquistou
um alimento com a sua identidade nacional, assim como a batata na Alemanha.